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Recomeçar. O crochê é um dos poucos trabalhos manuais em que o artesão pode desfazer a peça, voltar e corrigir os erros, segundo a professora de artesanato Andréa Aguiar. “Essa é uma metáfora para a vida, e isso é tudo que quem está preso precisa. Aprender a recomeçar e não continuar no erro, tecer a vida de uma nova maneira, assim como a gente tece a peça”, explica Andréa. Desde o dia 15 de julho, 20 detentos do Presídio de São Joaquim de Bicas II, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, estão participando semanalmente de uma oficina que ensina técnicas diferenciadas de crochê, voltadas para a produção de bolsas sofisticadas.

Os 20 presos, que foram selecionados para participar da capacitação, são da ala de artesanato da unidade prisional, e já faziam trabalhos mais simples anteriormente. Agora, a ideia é que eles sejam multiplicadores, espalhando o conhecimento adquirido das novas técnicas para os outros detentos do seu pavilhão. Assim, a direção vislumbra espalhar o ofício para todas as alas e presos que se interessarem.

“A intenção é ter uma grande produtividade de peças e, consequentemente, mais lucro com as vendas. Nós percebemos neles muito desejo e muita vontade de aprender, o projeto instiga a esperança de um novo futuro. E tem também uma função terapêutica: eles trabalham o equilíbrio emocional, o sentimento de pertencimento, de utilidade, de produtividade”, conta a diretora de Atendimento da unidade, Letícia Alves. “Eles conseguem trabalhar em equipe e desenvolver o senso de empatia, quando um termina primeiro, ajuda o outro que ainda não acabou”.

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A iniciativa nasceu da necessidade de capacitar e aperfeiçoar os trabalhos de crochê que eram feitos na cela. Além da remição de pena, o projeto também visa à geração de renda e ao tratamento terapêutico. A parte financeira será gerenciada pelo Conselho da Comunidade da Comarca de Igarapé. Dos lucros da venda, 25% ficarão com a unidade prisional, para a compra de material para a produção, e 75% serão destinados aos presos participantes e seus familiares.

Alex Magalhães Santos, de 29 anos, aprendeu crochê na cela com os outros presos, mas só sabia fazer tapetes e jogos de banheiro. Agora, ele vê no ofício uma fonte de renda para quando deixar o presídio. “Depois que a professora mostrou a tabela de preços relativa ao que ela vende, já criou uma expectativa na gente de ganhar dinheiro com isso. Dá para fazer duas ou três bolsas por dia. Quero guardar o conhecimento e levar para a rua”, diz. “Gosto muito do curso, crochê não é difícil. É quase uma terapia, quando você faz, você esquece dos problemas, das coisas ruins, você tem que concentrar, contar os pontos. A cabeça vai para outro lugar, sai desse momento de prisão e fica só no crochê mesmo”.

A ideia partiu da antiga diretora de Atendimento do presídio, Márcia Lopes Ferreira, juntamente com a juíza da Vara de Execuções Penais da Comarca de Igarapé, Bárbara Isadora Santos Nardy. De acordo com a magistrada, é seu dever acreditar na ressocialização e incentivar projetos do tipo. “Eu falo sempre o seguinte: eu não crio a lei, eu aplico. E o que eu quero é que as pessoas retornem para a sociedade melhores do que quando entraram no presídio”.

Em busca de novos projetos visando a ressocialização dos presos, Bárbara e Márcia começaram a buscar parceiros, e, por meio do movimento Tio Flávio Cultural, encontraram a professora, psicóloga e artesã Andréa Aguiar, que aceitou lecionar voluntariamente. Ela aprendeu o ofício na adolescência, e é a primeira vez que dá aulas em um presídio, onde se surpreendeu com os seus alunos.

“Estou adorando, é muito bom. Eles têm muito interesse e aprendem rápido”, conta Andréa. “Eles me desafiaram e me pediram para ensinar um ponto difícil. Eu mostrei o ponto mais complicado, que muita gente custa para aprender no ateliê, e eles aprenderam em um segundo”, comemora.

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Texto: Fernanda de Paula

Fotos: Dirceu Aurélio/ Ascom Sejusp

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