Para que as audiências judiciais não ficassem comprometidas durante o período de isolamento social, a tecnologia se tornou grande aliada na construção de uma alternativa às centenas de audiências presenciais que eram realizadas diariamente nos fóruns de todo o Estado. Custodiados e adolescentes em conflito com a lei estão conversando com os juízes por meio dos sistemas de videoconferências sem precisar sair das unidades onde cumprem sentença. Em vinte dias de operação, já foram realizadas 608 audiências por videoconferência nas salas montadas no interior dos estabelecimentos prisionais e socioeducativos administrados pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). A intenção é que, bem sucedida, a experiência possa ser replicada no período pós isolamento, contribuindo e somando esforços com a execução penal.

O Governo de Minas distribuiu 208 kits que incluem computadores, modem e webcams para presídios, penitenciárias e centros socioeducativos. O investimento, da ordem de R$ 2,5 milhões, é mais uma ação da Sejusp para enfrentar a pandemia e conter a disseminação da Covid-19 nos estabelecimentos penais e de reeducação para jovens em cumprimento de medida de internação. O esforço de várias áreas – informática, logística, custódia e ressocialização – foi necessário para que o projeto pudesse ser aplicado em todo o Estado.

A iniciativa já fazia parte da rotina de algumas unidades de Minas, mas ganhou reforço e ampliação com a compra de novos equipamentos para atender 100% das unidades prisionais e socioeducativas. Além disso, uma equipe específica da área de Tecnologia da Informação está trabalhando diariamente para testar todos os equipamentos e não deixar que nenhuma das 194 unidades prisionais e nenhum dos 25 centros socioeducativos de internação fiquem de fora do projeto.

Segundo o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o estado é o segundo do Brasil com o maior número de audiências a distância, mesmo ainda em caráter experimental. Faz cerca de um ano que os operadores do Direito e a Sejusp avaliam a implementação efetiva da prática, seja do ponto logístico e financeiro, mas, sobretudo, do ponto de vista humano. Para o juiz Luiz Carlos Rezende e Santos, que acompanha estes diálogos e é defensor das videoconferências, “o período de pandemia chegou e nos obrigou a fazer as transformações, e que bom que as transformações já estavam sendo pensadas”. “O Tribunal de Justiça fica muito satisfeito com o esforço que a Sejusp tem feio para que todas as unidades prisionais tenham condições para dar todo conforto logístico aos indivíduos privados de liberdade”, diz.

De acordo com o magistrado, as audiências virtuais serão norma durante este período de pandemia. “Este é um caminho sem volta, desde que continue com a excelência dos trabalhos, com a segurança necessária para que a pessoa privada de liberdade e os operadores do Direito tenham condições de distribuir da melhor maneira a Justiça. Estamos avançando muito para a melhoria da prestação jurisdicional”, pontua o juiz da Vara de Execuções Penais de Belo Horizonte.

Os números em Minas surpreendem. Em média, são pelo menos 25 audiências virtuais realizadas diariamente em todas as regiões do Estado. Mas há dias, como a última terça-feira, 26/5, em que a expectativa é superada e 106 audiências são finalizadas e bem sucedidas. A ação beneficia toda a rede: Poder Judiciário, sistema prisional, sistema socioeducativo, servidores e custodiados. Além da agilidade nos trâmites judiciais, há maior segurança, já que não são necessárias a realização de escoltas e a circulação de presos – isso sem contar com a redução de custos com combustível para os deslocamentos, por exemplo. 

Para o diretor-geral do Departamento Penitenciário de Minas Gerais, Rodrigo Machado, a possibilidade de ampliação dos atendimentos jurídicos neste momento de pandemia e enfrentamento de uma crise sanitária é mais uma importante ação da Sejusp em parceria com o Poder Judiciário. “Quanto mais as unidades puderem promover as audiências a distância, menor será a circulação de pessoas para o ambiente extramuros e mais amplo será o atendimento ao preso, tão necessário para o seu processo de ressocialização”, destaca o chefe do Depen.

Primeira sala de videoconferência

Em Manga, no Norte do Estado, a primeira videoconferência foi realizada na terça-feira (26/5). Já no Presídio de Vespasiano, na Região Metropolitana da capital, as reuniões virtuais já fazem diferença na rotina dos gestores. “Antes da pandemia, tinha dia que não havia condições de atender a todas as demandas de audiências das comarcas. Agora, um computador e o apoio imprescindível dos juízes fizeram total diferença no nosso trabalho. Não é preciso mais realizar o deslocamento dos internos e as escoltas”, pontua Eliane Lopes Coelho, diretora-geral da unidade prisional. O Presídio de Vespasiano realizou quatro audiências a distância e já tem outras sete agendadas.

Na Penitenciária Jason Soares Albergaria, em São Joaquim de Bicas, os testes com o Fórum de Contagem foram realizados com sucesso. Há uma semana a primeira videoconferência aconteceu na sala recém-inaugurada, reformada com mão de obra prisional. De lá para cá já foram cinco audiências realizadas. Wanderson Cristiano Gonçalves foi o primeiro preso a testar a videoconferência com a 4a Vara Criminal de Contagem e aprovou o uso da tecnologia na audiência com o juiz.

Em Uberaba, no Triângulo Mineiro, a realização das videoconferências foi pioneira em Minas. Ao longo de oito meses, a parceria com a Justiça Federal contabilizou economia de R$ 140 mil para os cofres públicos, segundo a direção da Penitenciária Professor Aluízio Ignácio de Oliveira, primeira do Estado a colocar em prática a audiência virtual. O mesmo aconteceu em Divinópolis, na região Oeste do Estado. Os encontros virtuais entre juízo e réu começaram em agosto do ano passado, inicialmente uma parceria entre o Presídio Floramar e o Fórum de Carmo do Cajuru. Deu tão certo que agora mais três salas na unidade prisional estão sendo utilizadas para a realização das audiências a distância com as comarcas de Itapecerica e Divinópolis.

Abraços virtuais

O mesmo equipamento distribuído em todo o Estado para realizar as audiências de custódia pode ser utilizado para aproximar aqueles que estão privados de liberdade dos seus familiares. Com a suspensão das visitas no sistema prisional e redução no sistema socioeducativo em função da pandemia, os computadores são aliados para receber o carinho dos familiares. O Presídio de Andradas foi o primeiro do Estado a implantar a visita virtual por meio do projeto “A esperança vem de casa”. Além de Andradas, outras unidades já aderiram à iniciativa, como o Hospital Psiquiátrico e Judiciário Jorge Vaz, em Barbacena. Em Varginha, Guanhães, Uberaba, Divinópolis, Passos, Abre Campo, Almenara e Novo Cruzeiro também já acontecem os abraços e sorrisos virtuais.

Os encontros a distância acontecem de segunda a sexta-feira, geralmente na parte da manhã, em horário que não coincida com as audiências judiciais. Cada unidade realiza o levantamento sobre quem deseja realizar as visitas virtuais e o Serviço Social entra em contato com a família para saber do interesse e verificar a possibilidade do encontro. O resultado deste projeto é acalento nos corações de quem dá e recebe as notícias.

Texto: Fernanda de Paula e Flávia Santana

Fotos: Divulgação Sejusp