Para um professor que nunca entrou em uma escola de um presídio ou de um centro de internação de jovens em conflito com a lei, a apreensão é o sentimento inicial. Em pouco tempo, a certeza da escolha acertada passa a predominar, pelo menos para a maioria deles. Em Minas são 1.355 professores que atuam em escolas instaladas dentro de unidades socioeducativas e prisionais administradas pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp).


Em Montes Claros, no Norte de Minas, o professor de matemática Valdir Alves dos Santos Filho foi pego de surpresa com a possibilidade de dar aulas na Escola do Centro Socioeducativo do município. Ele tinha acabado de ingressar, por meio de concurso público, na Secretaria de Estado de Educação, em 2016. “Algumas professoras olhavam, junto comigo, vagas nas escolas da região e disseram ser perigoso no socioeducativo. Após conversar com um inspetor escolar, fui. Logo vi que precisavam de mim e senti que faria a diferença na escola”, revela orgulhoso.

O professor Valdir já encontrou, por acaso, nas ruas de Montes Claros, vários ex-alunos. Ele relata como os jovens fazem questão de cumprimentá-lo, e muitas vezes mostram o uniforme de uma outra escola ou da empresa onde estão empregados. “A gente vê esses alunos como se fossem filhos. Imediatamente pensamos: deu para salvar mais um. É sobre salvar vidas mesmo”, conta emocionado.


Em outro ponto do estado, no Triângulo Mineiro, o professor de história Joenildo Fonseca Leite tem uma década de experiência na Escola Estadual do Centro Socioeducativo de Uberlândia. “Devemos tratá-los de uma forma holística e jamais ter uma prática educacional com resquícios nos atos cometidos por eles. Os adolescentes são cidadãos em construção”, analisa o professor.

A história de Joenildo começou no CSE de Uberlândia pela necessidade em substituir um colega. Ele gostou da experiência e seguiu. Hoje, faz questão de dizer que sempre procura atender todas as demandas educacionais, dentro do tempo de estudo e de aprendizagem de cada um, com diferentes metodologias. “Temos alcançado grandes vitórias. Alguns alunos chegam no ciclo de alfabetização e conseguem deixar a escola do Centro Socioeducativo como jovens prontos para o ensino superior”, relata feliz.


Na avaliação da superintendente de Políticas Pedagógicas da Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, Esther Augusta Nunes Barbosa, não há dificuldade em conseguir professores interessados nas vagas em escolas das unidades socioeducativas e do sistema prisional. “Os professores costumam se especializar nesta área da educação e ter grande apreço por estes alunos e pelo processo de escolarização dentro destas especificidades. A atuação destes profissionais é de extrema importância, não apenas para a educação, mas para toda a sociedade”.

Admiração

Depois de seis anos de experiência como pedagoga no Presídio de Vespasiano, Regina Dias Duarte é atualmente a diretora de Ensino e Profissionalização do Departamento Penitenciário de Minas Gerais. Para ela, a escola dentro de uma unidade prisional vai muito além de transmitir conteúdo formal. “Ela gera possibilidades e significa uma transformação na vida de homens e mulheres privados de liberdade. Os professores merecem todo o nosso respeito e valorização”.

No sistema socioeducativo a escolarização dos jovens em cumprimento de medidas é uma obrigatoriedade. Para a diretora de Educação e Formação Educacional, Profissional, Esporte, Cultura e Lazer da Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo, Emanuelle Lopes Miranda, a escolarização representa uma possibilidade de o jovem encontrar um caminho diferente daquele que o levou à medida socioeducativa.

“A parceria com a Secretaria de Educação, que viabiliza esse processo, seja nas escolas existentes dentro das unidades ou nas escolas em regiões onde os jovens das medidas de semiliberdade estão inseridos, oferece chances de eles fazerem novas escolhas, estabelecer outras relações, inclusive com os conteúdos, e ainda superar dificuldades e limitações”.

Talentos

No primeiro dia da professora e atriz de teatro Sandra Cristina de Almeida na escola da Penitenciária de Juiz de Fora I (José Edson Cavalieri), na Zona da Mata, ela chegou vestida com duas peças largas, uma calça e uma camisa social. Ambas pertenciam ao marido. Sandra, da mesma forma que inúmeros professores, teve medo de trabalhar dentro de uma penitenciária, mas este sentimento ficou no passado.


Ela começou com o projeto Literarte, no qual os alunos de várias séries liam poemas e textos em prosa, para depois fazerem encenações destas leituras. “Isto me fez ter certeza da possibilidade de trazer dignidade para estas pessoas. A literatura e a biblioteca viraram o coração da escola”, relembra. Somado a estas atividades, Sandra ainda conseguiu levar escritores para debates com os alunos.

Infelizmente, muitos presos procuram a escola interessados na remição de pena, pondera a professora, pois a Lei de Execução Penal garante a cada três dias de atividades escolares a redução de um dia na condenação. Contudo, a experiência mostra que este interesse não é sustentado por muito tempo. Somente a vontade de aprender e crescer mantém os homens e mulheres nas escolas das unidades prisionais.

Para a professora, todas as portas já se fecharam quando uma pessoa é presa, no entanto, a escola ajuda a encontrar as chaves. “A vida vai se tornando mais leve quando um homem ou uma mulher começa a ler e entender um documento, quando consegue escrever com clareza um bilhete. Para os policiais penais os presos da escola são diferentes, nos comportamentos e no jeito de falar”, observa.

Assista ao vídeo com trechos de depoimentos de profissionais que atuam na área Educacional dos sistemas prisional e socioeducativo:

Texto: Bernardo Carneiro

Fotos: Divulgação Ascom Sejusp

Edição de vídeo: Victor Laia

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