Em tempos de redes sociais, internet e jovens ultraconectados, propor aos alunos uma atividade de escrita de cartas em sala de aula pode soar meio antiquado. Mas para jovens que cumprem medidas de internação em Uberaba, no Triângulo Mineiro, a troca de cartas acabou se tornando um ótimo recurso para promover a leitura, a escrita e, principalmente, um intercâmbio cultural entre adolescentes de realidades distintas.

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Foi pensando em proporcionar essa troca de experiências que a pedagoga Laudeth Alves dos Reis, do Centro Socioeducativo de Uberaba, propôs à Escola Municipal Adolfo Bezerra de Menezes a ação conjunta entre os alunos do 8º e 9º ano e os adolescentes acautelados na unidade socioeducativa. “A ideia era sensibilizar nossos adolescentes e mostrar a eles que não estão sozinhos. Que mesmo em meio a nossas crises e problemas, sempre teremos alguém torcendo por nós”, explicou.

Um dos participantes da experiência, Rafael de Deus*, 19 anos, conta que foi muito emocionante receber palavras de conforto de uma pessoa desconhecida. “Jamais achei que um dia receberia uma carta tão importante de alguém de fora que nem me conhece. Estar aqui dentro nos faz sentir muito sozinhos às vezes, e as palavras de carinho que recebi na carta só me fortaleceram para continuar firme”, disse.

Michael Reis*, 18 anos, também se emocionou bastante com as palavras da carta recebida, uma vez que o remetente também passou pelo sistema socioeducativo. “É difícil para a gente que está aqui descrever o que sentimos, e ouvir conselhos para seguir firme na fé e se dedicando aos estudos de alguém que sabe exatamente como é isso me emocionou bastante. Estou me sentindo mais forte e motivado a mudar meu caminho”, contou.

Como a proposta da ação era a troca de experiências entre as duas realidades, após receberem as cartas dos alunos da escola municipal os jovens acautelados escreveram suas respostas para serem enviadas.

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Gustavo Flores*, 16 anos, contou que se sentiu muito apoiado com a carta recebida e quis retribuir tentando fazer a diferença para quem fosse receber a dele também. “Eu agradeci muito pelas palavras que me fortaleceram aqui dentro e também enviei conselhos. Disse para a pessoa se concentrar nos estudos, valorizar sua família e a sua liberdade e pensar muito para que suas ações não a levem a viver essa experiência aqui”, relatou, emocionado.

De acordo com a pedagoga, o objetivo da ação foi mais que superado. “A sensibilização foi tão grande que mesmo hoje, dias após a troca das cartas, percebemos que nos momentos de tristeza dos jovens aqui dentro eles recorrem à correspondência para terem uma palavra de consolo e esperança. Isso é impagável para a gente”.

Para o diretor-geral da unidade, Wilson Alves Pereira, esse tipo de ação fortalece os laços dos jovens com a comunidade e os prepara para uma volta com mais aceitação e empoderamento. “O papel da medida é preparar os jovens para esse regresso à sociedade, e o nosso dever é proporcionar o máximo de atividades que os deixem prontos para esse momento. A gente percebe que a sensibilização causada com essa ação fortaleceu a vontade dos nossos adolescentes em desenhar uma nova história ao saírem daqui”, afirmou.

*Os nomes dos adolescentes são fictícios para preservar as identidades, segundo indicações do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Texto: Poliane Brandão

Fotos: Divulgação Ascom/Sejusp