Para Fernanda Silva, o Programa Fica Vivo! foi fundamental na sua trajetória para se tornar atleta do Futsal Feminino do Cruzeiro

Tornar-se um atleta profissional e atuar em um time de renome está entre os sonhos mais comuns que as crianças cultivam ao longo da infância, embora muitas abandonem esse desejo conforme a trajetória de vida lhes impõe certos obstáculos. Contudo, para algumas delas, as barreiras são vistas como um combustível, que as impulsiona em direção ao ponto mais alto do pódio.
Sem dúvidas, Fernanda Silva foi uma dessas crianças. Atualmente com 33 anos, Fernanda agora faz parte de um projeto que, embora esteja em construção, tem à sua frente o vislumbre de um futuro brilhante. Foi a custo de muito suor, determinação e, acima de tudo, persistência que hoje ela se orgulha em dizer:
“Eu sou jogadora do time profissional de Futsal Feminino do Cruzeiro Esporte Clube!”
Toda história tem um começo…
O vínculo de Fernanda com o esporte surgiu ainda na infância, por volta dos cinco anos de idade. Vinda de uma família em que a paixão pelo futebol e, sobretudo pelo Cruzeiro, era passada através das gerações, foi na companhia de seu irmão, Paulo, que aconteceram seus primeiros “lances em campo”. Para eles, a varanda da casa em que moravam - no bairro Palmeiras, região Oeste de Belo Horizonte - era como seu Mineirão particular, o palco de partidas entre dois jovens craques do futebol mineiro. “O Paulo era fora do normal de bom de bola, meu irmão era craque. Nós ficávamos de um lado para o outro na varanda de casa brincando e foi aí que comecei a pegar gosto pelo futebol.”
Anos mais tarde, quando a família se mudou para o bairro Jardim Guanabara, na região Norte da capital mineira, Fernanda, então com seus 13 anos, compreendeu que a realização do sonho que fazia seus olhos cintilarem durante a infância não seria fácil. Nos primeiros anos de sua adolescência, ela treinava aos sábados na escola de futebol do bairro. Foi a partir das habilidades que adquiriu com a orientação do técnico Arnaldo, que Fernanda conquistou as primeiras oportunidades de participar de peneiras para integrar o que hoje são as categorias de base de clubes de Belo Horizonte.
Porém, ainda que a possibilidade de se tornar uma atleta profissional tenha estado ao alcance de seus pés, a realidade se recusava a impedir o avanço do ataque de Fernanda, posicionando obstáculos em uma boa retranca, criando uma forte barreira defensiva que a distanciava cada vez mais do desejo de, um dia, fazer do esporte sua profissão.
“Eu não acreditava que um dia eu iria jogar profissionalmente, que poderia viver disso ou algo do tipo. O sonho eu tinha, mas era bem difícil na minha época. Cheguei a fazer uns testes e na época eu passei. Só que minha mãe não tinha condições de bancar o deslocamento e não tinha como pagar para poder treinar. Aí acabei abrindo mão.”
Sonhos precisam de alguém que acredite neles!
Naquela época, Fernanda pensava que seria melhor pendurar as chuteiras e abdicar do seu sonho. Porém, aos 45 minutos do segundo tempo, o destino marcou um pênalti a favor da jovem, que encontrou no Programa Fica Vivo!, da Sejusp MG, a possibilidade de manter o seu sonho vivo no jogo. Na Unidade de Prevenção à Criminalidade (UPC) Jardim Felicidade, o caminho de Fernanda cruzou com o de Alírio, então responsável pela oficina de futsal ofertada pelo projeto.

Com o olhar atento, como o de um olheiro que observa uma jovem promessa, Alírio enxergou o grande potencial de Fernanda dentro da quadra e, com muito empenho, a convenceu a seguir acreditando que era talentosa e não deveria abandonar o esporte.
“O Alírio me passou um conhecimento gigantesco lá no Fica Vivo. Eu já estava desistindo, não queria mais jogar, e falei com ele: “Ah, Alírio, eu não quero jogar bola mais’. E ele: “Não, nada disso. Você vai jogar! Vem treinar aqui com a gente!” E eu decidi continuar. Ia aos treinos toda semana, acabei jogando muitos campeonatos e ganhando muita coisa com o Alírio.”
Quando alcançou os primeiros anos da idade adulta, Fernanda se deu conta de que era o momento de seguir em frente. Já desacreditada de que, um dia, se tornaria uma jogadora profissional, a jovem percebeu que era a hora de deixar as glórias do tempo no Fica Vivo! para trás, para que se transformassem em apenas boas lembranças, e buscar por uma profissão que lhe desse seu sustento.
Foi então que ela tomou uma decisão que, para aquela menina de cinco anos seria impensável: descalçar as chuteiras, guardá-las por tempo indeterminado e aposentar seu sonho de infância. Fernanda ficou completamente afastada das quadras e dos gramados por mais de dois anos e, quando retornou, optou por tratar o futebol apenas como um hobby.
O tempo passou e, embora tenha tido algumas boas experiências no futebol e futsal amadores ao longo dos anos - disputando o Campeonato Mineiro, o Campeonato Brasileiro e a Copa do Brasil de Futebol 7, popularmente conhecido como Futebol Society, Fernanda seguiu sua vida e consolidou sua carreira na área comercial. Porém, já próxima de completar seu trigésimo aniversário, ela fez uma jogada que nem mesmo o mais experiente dos técnicos poderia imaginar, algo digno do Futebol Total praticado pela seleção dos Países Baixos na década de 1970: Fernanda voltou ao Fica Vivo! para treinar novamente com Alírio.
Agora, com uma mentalidade mais madura e olhando para o futuro com os pés mais firmes no chão e na realidade, Fernanda fez de sua segunda passagem pelo Fica Vivo! um momento de redescoberta da sua paixão pelo futebol e pelo futsal.
“Eu acho que se eu não tivesse tentado novamente lá no Fica Vivo, se eu não tivesse tido os treinos com o Alírio e me apaixonado de novo pelo futebol, eu não teria dado seguimento, não teria quebrado aquela barreira. Eu já não tinha mais a emoção de acreditar que eu faria um teste e iria jogar profissionalmente, não tinha essa visão na época mais. Então, acho que o Fica Vivo ressuscitou o meu sonho e me resgatou de volta para o futebol.”
Fechada com o Cruzeiro!
Tempos depois do retorno de Fernanda ao Fica Vivo!, surgiu, em 2024, uma oportunidade com a qual ela sequer ousava sonhar. O Cruzeiro - um dos clubes mais tradicionais de Minas Gerais, e o time de coração da atleta - estava à procura de meninas para compor um time de Futsal Feminino. Apesar de acreditar que não teria chances de participar da peneira por conta de sua idade, Fernanda fez a inscrição e, para sua surpresa, foi convocada para participar dos testes junto com outras quase 400 garotas.
Foram quatro etapas realizadas naquele ano até que chegaram à seleção de 40 candidatas que, em janeiro de 2025, participaram de uma última peneira. Sob os olhares da comissão técnica, o talento de Fernanda brilhou como as cinco estrelas do manto celeste e ela foi escolhida como uma das 20 jogadoras que, há 9 meses, integram o time profissional de Futsal Feminino.
Hoje, Fernanda concilia sua rotina de trabalho no setor comercial com os treinamentos realizados semanalmente na Sede Campestre do Clube do Cruzeiro. Atualmente, ela e as companheiras disputam o Campeonato Mineiro de Futsal Feminino e estão classificadas para a fase final da competição.
Fernanda agora tem um novo sonho, ver o Cruzeiro Futsal Feminino alcançar um patamar tão significativo quanto alcançou o time de futebol feminino do clube, que foi vice-campeão do Campeonato Brasileiro Feminino de 2025 e que disputará, de forma inédita, a Libertadores Feminina, em 2026.
“Eu quero que o Cruzeiro cresça e quero estar junto. Se eu parar de jogar daqui a alguns anos e o futsal continuar, quero ajudar de alguma forma, quero estar presente daqui em diante. Espero que esse projeto dê seguimento, que não seja passageiro, que só evolua. Que seja o pontapé inicial para outros times de Belo Horizonte e de Minas Gerais investirem no Futsal Feminino e que o Cruzeiro se torne um caminho para o crescimento do futsal. Eu espero que o Cruzeiro continue e que eu esteja lá, tenho isso como meu objetivo para minha vida. Eu quero jogar!”
Onde há a Prevenção, o trem prospera!
Assim como aconteceu com Fernanda, o Fica Vivo! tem transformado a realidade de muitos jovens que residem em áreas marcadas pela vulnerabilidade e pela violência.
“O Fica Vivo é um dos seis programas que compõem a política estadual de prevenção social à criminalidade. Trabalhamos a partir de dois eixos: a intervenção estratégica, que atua em integração com as forças tradicionais de segurança e com o sistema de justiça; e a proteção social, que trabalha com as oficinas de cultura, esporte, lazer e com as atividades profissionalizantes para esses jovens dentro do território, chamando-os, de fato, a ocupar o território de uma forma não violenta, não vinculada à criminalidade”, explica a subsecretária de Prevenção à Criminalidade, Christiana Dornas.
Atualmente, o programa está presente em 33 UPCs de todo o estado e, somente em 2025, contribuiu para uma redução de 30,8% na taxa de homicídios de jovens com idade entre os 12 e os 24 anos, passando de 545 ocorrências em 2024 para 377 em 2025, no período de janeiro a setembro. Em Belo Horizonte, onde estão localizadas 13 das 33 UPCs que oferecem atendimento pelo Fica Vivo!, os homicídios entre jovens dessa faixa etária registraram uma queda de 40,9% na comparação entre os dois períodos.
O secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, Rogério Greco, compreende que estes dados são um reflexo de todo o trabalho desempenhado pela Subsecretaria de Prevenção à Criminalidade (Supec), por meio das equipes da UPCs nos mais de 200 territórios atendidos e celebra a potencialidade do Fica Vivo! na linha de frente do enfrentamento à criminalidade.
“O programa Fica Vivo! é mais do que uma política de segurança pública, é um investimento pragmático e direto no futuro dos nossos adolescentes e jovens. Histórias como a da Fernanda só nos provam que o Fica Vivo! oferece caminhos sólidos de desenvolvimento pessoal através do esporte, resgata talentos e, o mais importante, dá aos adolescentes e jovens uma perspectiva de vida digna, muito distante da criminalidade.”
Texto: Jaíne Cramer
Fotos: Tiago Ciccarini